PARÁBOLA DO HOMEM SÓ

Um homem ergueu altas e intransponíveis muralhas em volta de si. Queria proteger-se da bondade e crueldade humanas.
Viveu longos anos sozinho e tornou-se amigo da solidão. Perguntavam por este homem, mas ninguém sabia onde ele estava ou porque se escondia.
Esse homem sentia prazer e proteção em seu isolamento, por isso recusava-se ver o mundo lá fora. Era o rei de seu castelo e guardião de suas vontades.
Liberdade era tudo o que ele queria e ele sentia-se livre. Seu mundo era calmo e sem armadilhas, as que existiam lá fora.
Mas um dia, ao entardecer esse homem sentiu-se só. A solidão já não era sua companheira, era seu infortúnio.
Passou vários dias angustiado, buscando uma resposta para aquela súbita sensação...foi quando alguém bateu à sua porta....
Ele ouviu, pois suas muralhas se haviam enfraquecido, não era mais o mesmo. Este alguém que bateu à sua porta não sabia que aquele era um lugar de corpo fechado, inatingível, se soubesse, não bateria.
....O homem receioso abriu apenas uma janela...
A voz firme se ouviu de fora:
- Bom dia, meu senhor, sou um viajante, estou de passagem e tenho sede.
A voz trêmula ouviu-se de dentro:
- Dou-lhe àgua somente e pode seguir viagem.
...O trato cumpriu-se pela metade...
Ao saciar sua sede, o viajante, há dias caminhando só, sentiu naquele momento a chance de afeto humano. Quis conversar:
- Não se sente solitário, embora sejam belas terras?
O homem, meio intrigado, respondeu:
- Como você disse são belas terras e um homem não precisa mais que isso.
- Um homem precisa estar com os seus para sentir a presença de Deus.
- Deus está em mim.
-Deus está em todos.
-Não acredito, os homens são maus, egoístas e ganaciosos.
- O sonho de riqueza e vida farta está em todos; a bondade e maldade também estão.
- Aqui, não há maldade nem sofrimento.
- Você é egoísta. Há pessoas que precisam de você, e você precisará de pessoas quando o peso da solidão abater-se sobre você.
- Amigo, suas palavras soam como os sons da aurora, mas infelizemente é um homem só, não há muitos como o senhor.
-você é como eu, basta olhar para dentro de si. Não se torne escravo de suas muralhas. Você não é livre, está acorrentado por suas ideias errôneas. Saia e veja seu mundo de onde eu o vejo!
-Eu já sofri por causa dos homens.
-Mas pode sofrer mais pela falta deles. Não se engane mais. Tenha coragem, abra as portas, seja forte e olhe para o seu mundo prisão!
...O homem sai...
O homem se espanta com o que vê: muros altos, intimidadores.
- Sinta o cheiro da liberdade, não olhe para o tempo que perdeu. Siga em frente e tenha esperança sempre!
- Sinto-me frágil, ou mesmo, fraco.
- Não é fraqueza. Você tem medo de parecer fraco. Isso escondeu seus sentimentos, te fez perder a sensibilidade, mas caminhemos, venha comigo.
-Tenho medo!
-É natural que tenha medo, mesmo assim, siga em frente. Passaremos por muitos lugares, veremos pobreza e riqueza; homens bons e homens maus, mas sempre caminhando.

ELZENIR APOLINÁRIO 04/01/1998